23 de setembro de 2011

Ai se eu pego esse ônibus de novo

E lá estava ele, sentado no banco alto. Esse maldito banco que atrai crianças, velhas atarracadas cheias de sacolas, velhos com boné gasto e gente que gosta de sentar ali pra se sentir o dono do ônibus. Era assim que ele se sentia: o dono do ônibus. Lá estava ele com seu mullet encaracolado, abadá apertado (acho que ele não foi naquele show), bermuda bege, havaianas de uma outra marca se sentindo o dono do ônibus.

O coletivo parava em todas as paradas. Mil pessoas entravam todas as vezes. Mal dava pra respirar, mas ele tendo o poder de abrir a janela, não o fez. Podia estragar o penteado, sabe? As pessoas se aglomeravam na porta. Mesmo que elas fossem as últimas a descerem, tinham que ficar colados na porta. Na escada que é pra ter que descer do ônibus pra dar passagem.

O trânsito estava um caos e parece que todo mundo aquele dia estava em dúvida de onde deveria descer. Não importava pra quem você perguntasse qualquer coisa, ele respondia. "Cobrador, qual é a parada da Polyelle?" "A próxima", ele respondia com toda certeza do mundo. E foi assim por toda Comercial Norte. "Se você descer na próxima vai andar só um pouco", ele se intrometeu na conversa de um casal que estava sentado quatro bancos a frente. 

De repente quando a situação estava quase insustentável. Calor, ônibus parado, mil pessoas se aglomerando na porta, ele sacou o celular de dentro da bermuda bege. Eu ali de pé, pensei apreensiva: "Será? Não, meu Deus, não permita". Ele mexeu no menu. Ele apertou 'ok' e de repente pode se ouvir: "Nossa, nossa! Assim você me mata. Ai se eu te pego". 

Eu desabei. Quis chorar. Quase gritei. Empurrei tanto meus fones nas orelhas que as coitadas ficaram vermelhas. Ainda faltavam muitas paradas pro ônibus parar e mil pessoas pra entrar. As janelas continuavam fechadas e o calor aumentava e enquanto eu olhava pra o mullet encaracolados, pensava "Nossa, nossa! Assim eu te mato".